terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Futebol e Romance


É impressionante a quantidade de material produzido relacionado ao futebol. Colunas e cadernos diários em jornais impressos, programas de rádio e televisão, blogs e porque não, livros. Isso sem mencionar o marketing, ou a paixão voraz que faz trabalhadores minimamente assalariados direcionarem parte de sua renda para tão prazerosas atividades como: Ir ao estádio, comprar o manto de mais de cem reais, assinar um pay-per-view para não perder os jogos da Libertadores aka Copa do Caminhão, Sul-Americana aka Copa do Banco, aquele jogo do Estadual que vai "apenas" definir os confrontos da fase de mata-mata e que vai ser transmitido sábado às 20:30, bem na hora da novela/do jornal entre tantos outros prazeres dentro e fora das quatro-linhas. Apesar do consumo desenfreado e diário, um texto interessantíssimo que também serviu de apoio para a criação do blog me fez obviamente refletir na questão proposta: "Por que o Brasil ainda não produziu um grande romance sobre o esporte mais popular do País?" Talvez o questionamento seguinte seja apenas uma paráfrase, mas: Que barreira é essa, se é que o goleiro pediu, que não foi transposta para criação de um romance futebolístico?

Eu nem precio comentar, e mesmo aqueles que não gostam do esporte devem concordar que a cultura do nosso país passa pelo futebol. Já dizia o Sociólogo Gabriel Conh: "Sociólogo no Brasil que não tiver os fundilhos das calças puídas pelas arquibancadas não entenderá este país". Devem concordar também que a produção literária de um país está intimamente ligada com a cultura do povo/dos escritores que a compõem. Sendo assim, não é mais do que óbvio que nossa literatura tem um déficit quando todo o potencial encrustado na palavra futebol, ou ludopédio para os mais antigos, não é aproveitado? Talvez esses pontos poderiam direcionar à uma questão um pouco desgastada sobre o que realmente é literatura, mas isso fica, ou não, para futuras postagens.

Será que não seria de grande valia termos em contraste ao famoso romance de Graciliano Ramos, Vidas Secas, que retrata o sertanejo e todas as suas dificuldades o romance "Folha Seca"? Didi, o invetor do chute, que só foi possível graças ao tornozelo machucado, seria o grande personagem. Quem sabe poderíamos até encaixar a personagem de nome Baleia criando um jogo entre Botafogo e Santos, que mesmo sendo chamado de peixe, tem como mascote uma baleia. Será que não seria possível, tomando como base Animal Farm, clássico de George Orwell traduzido como A Revolução dos Bichos, termos algo como "A Revolução do Nílton"? Nílton Santos, lateral esquerdo do Botafogo que revolucionou a maneira de jogar pela cancha esquerda onde somente os pontas deveriam atacar. Os laterais agora, pelo menos ele, subia com mais liberdade e quase sempre era um ponto surpresa. Encerrando a série de devaneios, por que não em contraste à Quincas Borba termos o título "Quiques da Bola''? O personagem Machadiano que fica rico da noite pro dia, assim como o quique da bola, outrora uma ação corriqueira e basilar do jogo que passa da noite pro dia, ou do primeiro pro segundo tempo, a promover furadas de zagueiro, frangos de goleiro e por que não, títulos de campeonato!

Bem, com tudo isso em mente, mais o texto de Mauricio Stycer previamente citado que comenta a respeito da preferência da crônica quando o assutno é futebol, juntamente com os comentários do texto, podemos ter um direcionar maior a respeito do assunto. Além da questão que o autor desenvolve, um breve, mas muito útil histórico acerca da produção literária linkada com o futebol é compartilhada. Por fim, uma frase de Nélson Rodrigues onde aqui eu meu dou ao luxo de fazer uma pequena alteração, que irá entre aspas, parece sintetizar aquilo que eu gostaria de dizer a respeito de uma futura importância do futebol também na produção literária: Se Euclides da Cunha fosse vivo, teria preferido a história do "Futebol'' a Canudos para contar a história do povo brasileiro.

PS: No original, "Futebol" vira Flamengo. ;)





sábado, 13 de fevereiro de 2010

Começou!


A ideia de criar o blog surgiu com a leitura das crônicas agrupadas no livro Passe de Letra, escrito por Flávio Carneiro, livro que desde já recomendo para os amantes ou não de futebol. Segundo a própria introdução do livro, chamada pelo autor de "Aquecimento", o conjunto de folhas impressas e unidas trata de juntar duas paixões: futebol e literatura, humilde assim.

É praticamente impossível, para aqueles que já tiveram alguma relação com as ditas escolinhas de futebol, os times de rua e interclasse, as duplas/trios nos campeonatos de golzinho e todas as variantes de competições futebolísticas, não se ver na pele de Flávio, ou de seu pequeno amigo cubano que mesmo com um furacão foi jogar o "contra". Impossível não achar ou pensar em alguém parecido com o técnico Fausto: ex-jogador cheio de histórias [soa até redundante], que resolveu montar uma escolinha e que tinha alguma qualidade inconfundível, no caso do Fausto, o chute potente que teria até matado certo zagueiro.

Entre as várias histórias eu destaco:

Imagine ir ao cinema e escolher assistir, por exemplo, o filme O Sexto Sentido. Você lê a sinopse, se interessa, mas logo abaixo vem escrito "O personagem de Bruce Willis está morto a partir do minuto tal". A crônica Canal 100, onde somente a "insânia, insânia e só insânia" parecia ter vez retrata o cenário onde jogos já realizados eram retransmitidos em um cinema, mas a vibração por parte dos espectadores que já sabiam os resultados, era como se o jogo acontecesse no exato momento da transmissão.

O maior campeonato do mundo confirma algo que estudantes do curso de Letras que são amantes e praticantes do futebol sofrem a cada semestre: a dificuldade de se montar um time de futebol para a disputa de qualquer que seja a competição. Devido a esse percalço, um campeonato de golzinho de duplas com a duração de uma década tem seu início, sendo apresentando a cada fim de partida um detalhamento digno de um poet laeureate.

Quantos botafoguenses vocês conhecem que não são filhos de botafoguenses? É uma pergunta que sempre eu me faço quando o Botafogo perde um jogo, e sem exageros, isso é algo não tão incomum de uns tempos pra cá. Estrela solitária é uma crônica que já começa no fim da crônica anterior, chamada Torcedores. "Torcedor do Botafogo merece uma crônica à parte", e assim acontece quando fatos que só acontecem com o Botafogo e seus românticos torcedores são listados. É sempre o Fogão que troca de camisa quando o adversário tem uma igual, é torcedor que planta bananeira vendo o jogo entre tantas outras manias. Por fim, um conselho para aqueles que se aventuram na escrita e ainda não torcem por um time: "seja botafoguense e não lhe faltará inspiração."

Por fim, eu destaco a tríade: O Narrador, Os Personagens e O Enredo. Apesar de ser um estudante de Letras eu evito me enveredar pelos caminhos da literatura, e chego até dizer que tenho aversão a clássicos literários. Mas o fato é, que até então eu nunca havia percebido a clarividente relação entre a partida de futebol e as três palavras que dão nome às crônicas.

Jogo de futebol sem narrador? Até jogando futebol no vídeo-game um ou outro se aventura a narrar. E quem for flamenguista como eu sabe que aquele gol do Pet na final do Carioca aos 43 minutos não seria o mesmo sem a narração homérica do Luís Penido, claro, com a pedra de toque do Apolinho dizendo: "E acaba de chegar na Gávea São Judas Tadeu".

Os personagens, bem, a relação é auto-explicativa. Quanto ao enredo, eu só posso concluir que não há urgente necessidade de se inventar histórias sobre o futebol. Não é tão importante assim pensar em ficção-futebolística, pois a própria realidade do esporte já nos alimenta com narradores, personagens-jogadores-técnicos-gandulas-torcedores-cartolas-gramados-estádios de maneira infinita, e o enredo vai se construindo a cada rodada. Mas ao mesmo tempo, se privar dessa possível invenção de fatos dentro e fora das quatro linhas seria um desperdício.

Eu sou suspeito pra falar de qualquer coisa relacionada a futebol, mas a coletânea de crônicas é ímpar, assim como qualquer partida.